sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Os imigrantes



Nosso planeta é repleto de nações, povos, povoados e tribos, cada um com suas tradições, temperos, comidas, bebidas, vestimentas, ritmos e danças. Dentro deste contexto, nosso país surpreendente pela diversidade e riqueza cultural, com uma forte contribuição dos imigrantes, cuja beleza e versatilidade vai do Oiapoque ao Chuí.

Fomos comemorar meus 60 aninhos, em Bento Gonçalves, um lugar muito agradável onde pudemos passear pelas vinícolas do Vale dos Vinhedos e fazer um passeio de trem Maria Fumaça, de Carlos Barbosa para Bento. Um passeio mágico o qual também fomos agraciados com uma aula de história sobre a imigração italiana para o Brasil, que ocorreu logo em seguida ao “êxodo” dos alemães, e um almoço fantástico embalado por polenta, massa, frango, salada, carne de gado e um belo vinho tinto.

Os italianos, como os alemães, enfrentaram grandes dificuldades para chegar a terra prometida, a “América”, e aqui chegando trabalharam muito para tentar se estabelecer e se adaptar em um outro país, uma nova cultura, um outro povo.  

No dia seguinte ao passeio, a Lu havia me reservado outra surpresa: um jantar embalado pela beleza da dança árabe. 

Toda dança tem a sua beleza, seu balanço, seu ritmo e o desafio daquele que a pratica é transmitir em movimentos toda uma gama de emoções proposta pela melodia. A dança árabe nos oferece algo de uma beleza intensa através de corpos uníssonos em um balé corporal onde cada som parece ser inspirado dentro de um contexto no qual cada braço, perna, quadril, seio, lábios e olhares nos oferece uma perfeita sintonia com um tom, algo que é impossível parar de admirar, de se emocionar. Além do belo espetáculo, nosso jantar foi regado a especiarias árabe com um maravilhoso vinho tinto produzido pelos italianos e seus descendentes em terras gaúchas.

Diante desta miscelânea cultural, a ocasião ficou bem interessante pois na “terra” dos italianos e seus descendentes, um show de dança árabe foi ,no mínimo, algo intrigante.

Para finalizar nosso passeio não poderíamos deixar de visitar as tradições alemães e fomos à Blumenau para conferir a Oktoberfest. Um novo show de tradições, vestimentas, comidas, sons e ritmos regados a salsicha, joelho de porco, chucrute e cerveja, feitas por alemães e seus descendentes no vale europeu catarinense.

A essência de um povo está na sua história e a nossa é composta pelo somatório das histórias e características de vários povos que compõem esta miscigenação mágica que nos une e oferece o que poderíamos chamar de "o melhor da globalização".

https://www.youtube.com/watch?v=Dyp-P5CqvtI

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

O segredo do pajé

Há alguns muitos anos, li o livro “As aventuras de Tibicuera” do Erico Veríssimo.  O livro narra as aventuras, do índio Tibicuera, que se  iniciam em 1500 e terminam em Copacabana no ano de 1942, ou seja Tibicuera participa do descobrimento, da monarquia, da independência , da abolição da escravidão, da criação da república  e por aí vai. Um espírito “teimoso” que se faz perene, quem sabe, até os dias de hoje. Vocês devem estar pensando:
- Como alguém consegue viver tantos anos?
A resposta está no capítulo “O segredo do Pajé”, onde:

“ O remédio está aqui dentro, Tibicuera. Não há feitiçaria. O pajé gosta de ti. Ele te ensina. Escuta. O tempo passa, mas a gente finge que não vê. A velhice vem, mas a gente luta contra ela, como se ela fosse um guerreiro inimigo. Os homens envelhecem porque querem. Só muito tarde compreendi isso. Tibicuera pode vencer o tempo. Tibicuera pode iludir a morte. O remédio está aqui — tornou a bater na testa. — Está no espírito. Um espírito alegre e são vence o tempo, vence a morte. Tibicuera morre ? Os filhos de Tibicuera continuam. O espírito continua : a coragem de Tibicuera, o nome de Tibicuera, a alma de Tibicuera. O filho é continuação do pai. E teu filho terá outro filho e teu neto também terá descendentes e o teu bisneto será bisavô dum homem que continuará o espírito de Tibicuera e que portanto ainda será Tibicuera. O corpo pode ser outro, mas o espírito é o mesmo. E eu te digo, rapaz, que isso só será possível se entre pai e filho existir uma amizade, um amor tão grande, tão fundo, tão cheio de compreensão, que no fim Tibicuera não sabe se ele e o filho são duas pessoas ou uma só.”

É uma “visão” bem interessante sobre o que poderíamos entender como reencarnação.
Repentinamente esta bela ficção do Veríssimo me veio à mente outro dia quando sai para um lanche com o Th mais novo. Fiquei observando ele dirigindo do meu lado, lembrei de sua infância, sua adolescência e hoje na universidade. Nosso lanche foi regado a conversas sobre temas diversos e como não poderia deixar de ser, sobre a atual situação política do país e fiquei admirado com seu discernimento e sua maturidade
Tenho três filhos e o convívio com cada um deles foi, e é, um aprendizado gratificante no qual em várias ocasiões me vi/vejo na situação de “filho” e não de pai.
Sinceramente não sei como “adaptar” as lições de longevidade do pajé à dinâmica da vida contemporânea onde os relacionamentos afetivos são suscetíveis às intempéries dos apelos ao imediatismo, ao individualismo, ao consumismo, ao narcisismo, à disputa, ao egoísmo, ao individualismo em um mundo onde a prioridade passou a ser utilizar a tecnologia da virtualidade para mostrar o “eu estive lá”, “eu sou feliz”. Uma dependência emocional e “hormonal” do “like”, do “curtir” etc; mas com certeza tem algo que não mudou, não muda e jamais mudará que é o respeito da vida de um para com o outro, é o amor, a sinceridade, os valores, a ética, o exemplo que devem permear os relacionamentos familiares ou não.
Hoje além do convívio com meus filhos e minha querida Lu, tenho o privilégio do convívio com meus pais que tem 92 anos, mais um aprendizado gratificante na minha caminhada existencial.
Não consigo definir a dimensão de nosso relacionamento, avo-pai-filho, mas independente da “eternidade” de meu espírito, nosso convívio moldou o que poderíamos chamar de “eu”.

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

E se você descobrisse que morreria na semana que vem, o que farias?


Há 10 anos eu rabiscava um texto cujo o título era “Um novo cinquentar”, na época eu ainda estava trabalhando em Telecom, morávamos em um apartamento e tínhamos uma cadelinha chamada Frida.
Meu texto foi embalado pelo amanhecer da chegada do já meio século de muitas idas e vindas, chegadas e partidas, encontros e desencontros, mudanças e escolhas, lágrimas e sorrisos e de passeios matutinos com a Frida, que gostava de carinho mas era muito tímida no carinhar.
Eu costumava dizer que se eu morresse antes da Frida, ela ficaria em uma situação difícil, pois a pequenina não saia de perto de mim, onde eu estava ela ia atrás como um “personal angel” canino a cuidar de seu “dono”. Frida partiu antes, creio que está no céu fazendo as pazes com Amora, que precocemente também partiu.
Não sei se isto acontece com todos que chegam aos 50 anos, mas naquele momento bateu em mim algo diferente dos outros aniversários, algo de recordações com pitadas de saudades daqueles, cuja separação geográfica e por razões diversas, se fez presente, daqueles que partiram para outras moradas da casa do pai e de momentos incríveis que permearam minha existência até então. 
Agora, na perspectiva da chegada dos “60”, há alguns dias, a Lu me perguntou:
- Não vais escrever nada para o sexagenário?
Confesso que isto me assustou, pois pela primeira vez percebi que se passaram dez anos desde a primeira metade, supondo que 50 seja uma metade plausível para algumas encarnações que tem a pretensão de só partir aos 100, uma “meta” que não leva em consideração as diretrizes firmadas na “pré” encarnação.
Fiquei pensando sobre a pergunta da Lu e há três semanas, em um determinado momento o qual estava assistindo uma palestra na casa espírita, a palestrante olhou para mim e me fez a seguinte pergunta:
- Se você descobrisse que morreria semana que vem, o que farias?
Olhei para ela, creio que um pouco atônito, e respondi:
- Eu não sei.
Esta pergunta ficou tatuada em minha mente, e desde então me vem com frequência como um enigma o qual eu preciso decifrar, independente da espiritualidade ou do grau evolutivo que eu pretensiosamente tenha alcançado.
Durante os últimos dez anos nossa vida mudou, estive professor por 5 anos, mudamos para uma casa que fica pertinho do Atlântico Sul, o Th do meio foi morar no vale europeu tupiniquim, me tornei o cozinheiro oficial da prole, e no tocante ao rango, redigi e aprovei a constituição culinária do lar , de parágrafo único, onde : todos tem o dever de comer o rango todo e o direito de nunca reclamar do mesmo. Um limite “imposto” para amenizar possíveis equívocos culinários.
E o que realmente mudou em mim nesses últimos 10 anos? Interessante pensar nisso neste momento de minha vida. Considerando as perspectivas de minha geração, pelo menos a maioria, nosso foco era programado visando a realizações materiais: estudar, arranjar um bom emprego, constituir uma família, ter filhos, carro, uma casa, se aposentar e ir morar perto do mar. Isso eu consegui, e daí? É isso? E depois, qual os novos desafios, as metas? Creio que o grande desafio é a busca perene do aprender e do reaprender com os mais velhos e com os mais jovens, é encontrar a espiritualidade relegada ao segundo plano, é encontrar a serenidade e o discernimento necessários para prosseguir a caminhada em um mundo cuja dinâmica, infelizmente, nos convida ao individualismo, a futilidade, ao consumo, a superficialidade e ao falso entendimento de que nossa materialidade não é efêmera.
Na soleira do Atlântico Sul descobri que:
- meu inferno é do tamanho de meu orgulho, de meu egoísmo e de minha vaidade e os degraus de minha evolução, um desafio dioturno, são: a gratidão, o perdão, a indulgência e a caridade
- acordar todos os dias, ouvir, cheirar, ver, caminhar, falar, sentir, respirar são dádivas que carecem de cuidados 
- não precisamos de muito dinheiro, o belo está no simples, cozinhar é um prazer, a paciência é sublime, a amizade é um tesouro, o amor rejuvenesce
- o vento e a lua fazem do mar um "ser" passional
- a visita anual das baleias é uma emoção que nos remete à infância
- o vento gelado que sopra do Sul me encanta 
- quem ama cuida, quem cuida doa
- minha outra metade existe e preenche minha solidão existencial.
Enfim, se eu morresse daqui a uma semana, em meu último “enta” definido pelo destino, pelo acaso ou quem sabe pelos desígnios de Deus, eu consiga ter alcançado o que está resumido na letra da canção do poeta:
“Já sei olhar o rio por onde a vida passa, sem me precipitar e nem perder a hora”
By Brother60